sexta-feira, outubro 21, 2005
As cores daquele vestido tinham, em mim, um efeito perturbador. Eu olhava-a enquanto ela se pavoneava pela casa. Perguntava se estava bem. Eu acenava com a cabeça e lançava-lhe um olhar de desejo. Tinha ganas de lhe rasgar a roupa, encostá-la a uma parede e beijar-lhe os olhos. Prendia-lhe os braços...deixava-a sentir o calor do meu corpo... E nestes delírios me perdia sem nunca lhe conseguir tocar. Não tinha jeito para possuir uma mulher assim!
quinta-feira, outubro 20, 2005
O cansaço invadia-nos de repente e já não havia nada a fazer senão enrolar os nossos dedos uns nos outros e assim permanecer até ao dia seguinte. Havia sempre a esperança que surgisse uma bola de energia que nos entrasse no corpo e nos fizesse sair daquela letargia. A inércia tornou-se, assim, um estado constante que nos angustiava, mas que não nos deixava ir para lado algum. Faltavam-nos força e vontade de acabar com aquilo. E aquilo arrastou-se até à eternidade...
segunda-feira, outubro 17, 2005
Muitas vezes pensei que a ignorância era o estado mais feliz para qualquer ser humano. Não me enganei: não se pode desejar o que não se sabe que existe!
sábado, outubro 15, 2005
Isto não está certo! O mar enrolava-se na areia e fugia. E eu que queria apanhar cada gota daquela água salgada. Podia ser a última vez que a via. E ela não deixava... e não deixou, mesmo!
sexta-feira, outubro 14, 2005
Íamos juntos para a Ericeira naquelas tardes de Julho abafadas. Lá estava sempre um ar mais fresco. Comíamos um queque e bebíamos uma meia de leite no Salvador. Descíamos à praia e observávamos as famílias com as criancinhas irrequietas e barulhentas e eu jurava que nunca ia querer uma assim. Depois vieste tu. O fruto concebido numa dessas tardes de Julho abafadas. Uma criança irrequieta e barulhenta que me lembrava as da Ericeira. Não sei se te amo. Não foste desejado. Só sei que não posso viver sem o teu sorriso, as tuas mãos no meu rosto enrugado e velho. Habituei-me a ti para me desabituar dele...
quinta-feira, outubro 13, 2005
After Lunch And after noon the well-dressed creatures come
To sniff among the dead
And have their lunch
And all the many well-dressed creatures pluck
The swollen avocados from the dust
And stir the minestrone with stray bones
And after lunch
They loll and lounge about
Decanting claret in convenient skulls
Harold Pinter* September 2002
*Prémio Nobel da Literatura 2005
Numa fria noite de chuva desci as escadas e vi-te à minha espera. Cambaleava...talvez por cansaço ou bebedeira, não me lembro. Abriste os braços e amparaste-me a queda. Podia ser uma metáfora do que esperava de ti. Mas não foi. Foi só para não me deixares cair no meio da rua.
terça-feira, outubro 11, 2005
Estávamos perdidos num mundo de absoluta alienação. Apenas o amor a encher-nos os dias. Desfizemo-nos de todas as artimanhas digitais que nos povoavam a casa. Não era fácil. Tínhamos demasiado tempo para nós. Era um teste de resistência emocional. Não era fácil, mas conseguimos!
segunda-feira, outubro 10, 2005
Nos recônditos lugares de uma alma encontram-se, geralmente, segredos inconfessáveis. Tão inconfessáveis que o próprio, muitas vezes, é o primeiro a esquecê-los.
terça-feira, outubro 04, 2005
Eu era sempre o que ninguém escolhia para a equipa de futebol do bairro. Era o "quatro olhos", o desengonçado. Eu era aquele que as miúdas escolhiam para amigo e confidente. Um dia, tudo isso mudou. Uma sueca de férias no Algarve, achou-me piada. Fiz-me homem e fiz-me à vida. Dormi com metade de Lisboa. Era fácil: bastava falar da tal sueca... Hoje sou aquele que não sabe amar, apenas coleccionar presas, levá-las para a cama e fugir antes do amanhecer. E não sei se gosto desta vida!
segunda-feira, outubro 03, 2005
Fuga. Sempre presente. Nas palavras, nos pensamentos... Essa nobre arte de desaparecer sem deixar rasto e recomeçar. Fuga, o óbvio dos cobardes!